quarta-feira, 13 de agosto de 2014


ARTIGO CIÊNTÍFICO:

HISTÓRIAS DE VIDA SURDA: IDENTIDADES EM QUESTÃO

Publicado em 1998
Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre

Autor(es): Gladis Perlin ( professora e investigadora)
É preciso conhecer esse trabalho lindo e riquíssimo que a professora gaúcha pós-graduada desenvolveu, baseada em todas as suas experiências e vivência como surda, com muitos questionamentos, reflexões e posições onde ela retrata seus sentimentos, conceitos sobre a causa que ela levantou bandeira “identidade surda” resolveu estudar, investigar o cotidiano de vários surdos e mudos e apresentou por meio de entrevistas, um trabalho que ela descreve como:

 “Gladis Perlin  longo, sofrido e com muita persistência de processo pessoal de construção e desconstrução de valores, conceitos, visões de mundo, cultura, língua, etc. Toda a reflexão aqui contida foi o resultado de leituras novas, que me fizeram pensar o sujeito surdo relacionado com referenciais móveis constituídos pelos discursos. As relações que tento fazer nesta pesquisa transitam por muitos aspectos, tais como: as subjetividades, as identidades culturais, as relações desiguais de poderes que se interpelam e se narram cotidianamente”.

Veja um pequeno trecho do depoimento de um dos surdos que ela entrevistou, vale a pena conferir, pois é apenas um, de vários.
Não sei como me descobri surda. Acho que ser surda é uma consequência normal que somente se descobre a diferença com o tempo. Eu sentia o silêncio do ser surdo. Creio que aconteceu por acaso.
Negavam-me os contatos com LIBRAS, eu e minha irmã também surda fomos oralizadas. Tínhamos pouquíssimos sinais, nos comunicávamos através de mímica. Era uma comunicação pobre. Sentia que eu e minha irmã falávamos com os ouvintes e não éramos entendidas.
Atualmente sinto raiva quando não entendo e não sou entendida. Acostumei-me a ser surda. Meu sonho é ser ouvinte, o que gostaria muito. Sinto-me com crises de nervosismo e tensão por ser surda. Isso me deixa desnorteada, revoltada pela situação. Sonho sempre em ser ouvinte. Sinto-me triste por não poder ir mais longe. Sinto que estou numa loucura para poder ser ouvinte.
Gostaria de ouvir música, tenho vontade de comunicar-me pelo telefone.
Sinto que poucos me aceitam como surda. Quando estou com ouvintes não aguento. Eles começam a falar entre si e eu tomo uma atitude qualquer, ou peço licença para ir fazer outra coisa.
P. Em tua família acontece a pressão para falar como o ouvinte? Sim. Chamei de Popi meu cachorro. O nome dele é Bobi. Minha mãe insistiu em corrigir-me até que eu conseguisse pronunciar bem o nome. “Fale certo, por favor,” é a frase que tenho de ver sempre em seus lábios. Apesar de minha idade, ela diz que eu tenho necessidade de aprender muitos fonemas. Quando minha irmã se formar vai me ensinar a oralizar certo (F.).

Fonte:
http://www.porsinal.pt/index. Php?PS=artigos&idt=artc&cat=20&idart=153



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Um comentário:

  1. Na verdade nossa sociedade não se encontra preparada ainda para uma vida compartilhada com a diferença. nossos irmãos surdos ainda hoje sofrem algum tipo de preconceito, e isso faz com que boa parte deles não tenha o acesso aos seus devido direitos regidos na lei.
    O que a pessoa da entrevista sente em ser surda, é o fato do despreparo de profissionais e da família, com isso ela se tornou uma pessoa triste, por não ser entendida da maneira correta e por não ter tido a motivação para alcançar seus sonhos.

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